Moro fora há quatro anos e, sinceramente, hoje e depois de tantos acontecimentos no Brasil chego a seguinte conclusão: o Brasil não nos merece. Para conseguir ver a ilha tive que me distanciar e ter uma experiência no exterior para perceber que, enquanto “cidadãos” somos, no mais dos mais, tratados como lixo e com um desprezo por quem comanda a nação que causaria espanto até nos mais descrentes.
Obviamente que escrevo esse texto ainda no calor do incêndio que deu fim ao Museu Nacional (Palácio Imperial), mas também como um desabafo e, quiçá, um conselho para você que eu nem conheço e que está me doando o seu tempo e lendo as minhas palavras. Espero, do fundo do meu coração, que as linhas abaixo sejam suficientes para reforçar o título: o Brasil não nos merece.
O Brasil não nos merece
Não, o Brasil não nos merece. E não merece quem tenta ir, todos os dias, de encontro às injustiças, que faz de tudo para não ser corrupto em qualquer escala. Sim, me refiro a quem não ultrapassa pelo acostamento, quem não fura fila e até àqueles, se é que eles existem, que exercem algum cargo público no executivo e não metem a mão na grana dos outros em benefício próprio.
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Mágoas da partida
Quando deixei o Brasil para morar fora, confesso que vim um tanto quanto magoado. Ter que deixar o país que a gente nasceu, a nossa família, emprego, empresa e o pouco que temos e conquistamos é frustrante. Dar um passo adiante que, sinceramente, também significa dar muitos passos para trás.
Eu, por exemplo, deixei de ser professor para voltar a ser aluno, deixei de ser proprietário de uma empresa para ser desempregado, deixei de ser um cidadão do meu país para me tornar mais um “maluco emigrante” do Brasil que está tentando a vida fora. Apenas mais um.
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De longe
Com o tempo as coisas vão se ajeitando, a gente vai colocando a cabeça no lugar e as coisas começam a acontecer aqui fora. Hoje, quando assisto pela TV ou em algum site, notícias sobre o Brasil, sinto um misto de orgulho com decepção. Tenho orgulho por ter enfrentado todos os meus medos e partido, mas fico decepcionado em ver que muita gente sofre sem, na maioria dos casos, saber e entender os reais motivos.
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Estado de nervos
Em tempo de eleição e com os nervos saltando, tenho cada vez mais a certeza de que, infelizmente, não vou ver o Brasil sair do buraco em que se meteu, ou melhor, que nós o metemos. Vejo pessoas se digladiando por causa de políticos e, mais uma vez, sinto que a cortina de fumaça criada dia após dia (e não somente pelo fogo do Museu Nacional) não permite que vejamos muito além e é capaz de nos cegar mais ainda. E o pior, nunca se esqueça de 2 em 2 anos existem eleições, ou seja, a fumaça nunca se dissipa.
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Desista e parta
Certa vez me perguntaram se o Brasil tinha saída e, de pronto, respondi: “tem sim, fica em algum Aeroporto Internacional”. Novamente vou dizer, sem medo: desista do Brasil, não tem solução isso daí. E sabe quais os principais motivos disso? – nós. Nós brasileiros somos os principais motivos para que o Brasil não tenha solução.
O fogo no museu, o avião que caiu, o assassinato de algum conhecido, a ciclovia que desabou, a bala perdida, o estádio bilionário para a Copa, as obras na estrada que mata mais que uma guerra e nunca acabam (se é que já começaram). É, o Brasil não cansa de nos dar claros sinais de que não nos merece. Mas e nós? – nós continuamos com uma esperança que eu não sei de onde vem e, muito menos, onde vai chegar.
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O Brasil é bom (para alguns)
Conheço pessoas que “não trocam o Brasil por nada”. Eu troquei e trocaria mil, dez mil ou cem mil vezes. Me sentia um peixe fora d’água, não conseguia aceitar a maneira como as coisas aconteciam. Me fazia uma confusão mental desgraçada tentar entender, e principalmente aceitar, que no nosso país é o poste que faz xixi no cachorro, que tudo é relativo e que, independentemente do mal que um político cause ou causou, o que vale é sempre a tal da ideologia.
Nada vale muito
Se você, assim como eu, também ficou triste com o incêndio no Museu Nacional, saiba que essa é tão somente (e apenas) a materialização da incapacidade que temos em cuidar do que é nosso. Nada vale muito no Brasil, nem a vida de uma das 150 pessoas que serão assassinadas somente hoje, nem a decisão do juiz em prender a mulher que matou os pais a paulada, mas que sai da cadeia para passar o “dia dos pais” em liberdade.
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Nada me surpreende
Entendemos que o que é público não é de ninguém, que político é celebridade e que pouco importa o que se diz e sim quem diz. Nem o incêndio no maior museu do país é capaz de nos indignar, nada consegue nos fazer parar de correr para termos ao invés de sermos. O museu queimou porque “aquilo” não era de ninguém, assim como a sua vida, como a minha, como o acidente que matou quem você tanto estimava. Nós não somos nada, de ninguém.
Vida que segue
A vida segue e, dia após dia, fico sabendo de pessoas que, assim como eu, VAZARAM do Brasil. E, de novo, sabe o motivo? – eu te digo: O BRASIL NÃO NOS MERECE!. Deixei em letra maiúscula para que você consiga ler, sem erro, que a nação onde nascemos está fadada e tem somente o fracasso como garantia absoluta. Nós não temos jeito enquanto país e, tristemente, elegemos e deixamos que quem nos odeia ocupe o lugar para tomar conta de nós.
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Resultado
O resultado disso é mais do que visível, é sentido e se você ainda não sentiu fique bem de boa que, logo logo, a sua vez chega. A fuga de pessoas do país que, em um primeiro momento, não traz resultado prático para a sua vida e até causa certa inveja, bem rapidamente será esfregada sem dó na sua cara. Era aquele cara competente do banco que simplesmente “sumiu”, era aquela menina atenciosa e inteligente que “desapareceu” e não está mais na empresa. Pouco a pouco, de gota em gota ou como areia entre os dedos, vamos nos desfazendo enquanto país e aqui fora, já somos milhões.
Ainda dá tempo
Não acho que você deve partir por partir e que não deve se planejar muito, mas acho que o seu tempo está cada vez mais escasso. Ainda dá tempo, mas daqui a pouco poderá ser tarde. Se há alguns anos elegíamos os candidatos pela esperança, atualmente é a desesperança que nos motiva. As eleições em nosso país exigem que optemos pelo “menos ruim” e não pelo melhor desde que eu me conheço por gente.
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Eu demorei muito para compreender que o Brasil não me merece e, peço desculpas por colocar no plural, mas ele não “nos merece”. Nem eu, nem você e nem ninguém que é decente e só quer viver em paz e com alguma dignidade. Use o fogo do museu para acender em você a chama do seu foguete e parta em busca de um lugar que te mereça e que te valorize enquanto cidadão e cidadã.
Se encontrar esse cantinho (e são muitos) aproveite para se tornar aquele cara que você sempre sonhou ser no Brasil e não podia, pois tenho certeza absoluta que vale muito a pena.
Boa sorte!
9 Comentários
Amo muito meu país e doi muito pensar em deixa-lo, mais a verdade é que está cada dia mais dificil de viver aqui
Olá Tiago! Acredito que a Austrália seria um ótimo país pra vocês recomeçarem. Um abraço!
Ler esse texto era o empurrão que me faltava. Sou microempresário do setor de Internet e tenho uma certa tranquilidade financeira. Entretanto, faço parte da população LGBT e é muito difícil viver num país tão homofóbico. Conversei com meu namorado e decidimos que iremos nos mudar no próximo verão. Para nós, é um pouco mais difícil escolher um destino, pois além da questão de trabalho, precisamos nos atentar à homofobia também.
É decepcionante ler artigos como este. Sou Australiano e nunca fui ao Brasil (embora eu queir ir algum dia), que sempre me tem parecido como um país que tem muito potencial. Porém, é óbvio que o país está preso num cíclo vicioso de corrupção e mal administração. Neste contexto, assemelha-se muito à Índia como um país de muita esperança que não tem atingido tudo o que já podia ter alcançado e ainda poderia. Por isso, acho que qualquer pessoa que esteja frustrada pelos acontecimentos e estagnação evidentes no Brasil deveria explorar uma oportunidade de morar fora. Gostaria de sugerir a Austrália como um destino – temos uma qualidade de vida ultrapassada por nenhum outro país e, para além disso, precisamos de mais falantes de português!
O autor tem toda razão. Faz muito tempo que tenho este sentimento de deixar o Brasil, mas aprendi que eu preciso estar de bem comigo mesma enquanto eu ficar aqui ou mesmo indo embora, percebi que eu não posso ficar SÓ pensando nesta situação caótica que o país está, porque eu não quero que os meus dias se arrastam, mesmo eu estando no Brasil, eu preciso pensar/fazer alguma coisa para que a minha vida valha a pena, do contrário, eu posso entrar em desânimo e tristeza profunda, e isso não pode acontecer, já aconteceu algumas vezes mas não vou permitir que isto se repita.
Infelizmente, o autor está coberto de razão..às vésperas da eleição, tenho me perguntado muito isso, se o Brasil tem jeito, e tenho ficado cada vez mais desanimada. Como meu esposo já disse também, os políticos que lá estão não são alienígenas, mas sim, reflexo de nosso próprio comportamento: você que não respeita uma rotatória, que quer sempre tirar vantagem em tudo, que acha que é melhor que os outros, etc..Sou funcionária pública, tenho uma vida até confortável aqui, mas ainda sim, às vezes, ou muitas vezes, penso em largar tudo e recomeçar em outro lugar, porque as esperanças que eu tinha aqui estão se dissipando..e é muito triste viver sem sonhar com um futuro melhor, não só para mim, mas para todos nós brasileiros. Me dói ver o que eu pago de imposto, descontado todo mês no meu salário e a desigualdade social só aumentando a cada dia.
Pura verdade. Hoje eu tenho um sentimento de impotência muito grande vivendo aqui. Espero que um dia eu consiga realizar esse desejo de viver fora do Brasil. Adoro seus textos.
Percebi que o Brasil não me merecia em 89 quando saí de lá. E até hoje não me arrependo, principalmente quando tento não cair na armadilha da comunicação que não soma, apesar de saber que perco em popularidade. Falar sobre educação é minha paixão, mas não é o papo preferido pelos que lá preferem manter o status quo. E se educação, se a base, não é a prioridade de muitos, o que sobra tampouco me faz feliz.
Concordo plenamente! A tristeza de partir é substituída logo pela indignação do que o povo brasileiro transformou o Brasil e o que ele poderia ter sido (e não será).