E tem que ser, pois aqui fora ninguém vai lhe pegar pela mão.
Talvez você já tenha sentido solidão mesmo estando rodeado por diversas pessoas, porém morando fora a solidão será uma companheira e tanto e não terá ninguém ao seu lado. Lembro que quando cheguei aqui do outro lado, não tinha um amigo, um parente, um vizinho que fosse para me dar uma mãozinha. Não bastasse a mudança, a solidão começou a se apresentar, pois aqui eu estava sozinho, não tinha ninguém e precisava recomeçar. Não, a solidão não será capaz de nos fazer desistir, mas ela é mais um dos tantos desafios que a gente enfrenta quando resolve encarar uma vida nova, num outro continente, em uma cidade que a gente ainda não conhece, cercado de pessoas estranhas.
Momentos de Solidão
Quando desembarquei no meu destino final, a única pessoa que me esperava era a solidão. Sim, ela estava já no aeroporto segurando uma plaquinha com o meu nome. Eu personifiquei a solidão, pois foi a única forma que eu encontrei de tentar mantê-la distante. Depois, quando cheguei na minha nova e desconhecida cidade, lá estava a solidão na fila de espera dos serviços de imigração, ela fez questão de sentar ao meu lado na hora do almoço, no café da tarde na pracinha charmosa e dormiu no meu quarto naquelas primeiras noites. A solidão se aproveita de alguns momentos e teima em puxar conversa, faz de tudo para lembrar que, ao menos naquele momento, você está sozinho.
livro “Morar Fora: sentimentos de quem decidiu partir”
Transformando a solidão em força
Quando você se pega conversando com a solidão, você pode abrir duas portas: a do arrependimento ou a da coragem. Eu optei pela segunda, porém sei que muitas pessoas não tem a mesma sorte e se arrependem e isso é perfeitamente aceitável e normal. Sair do certo e mergulhar no duvidoso é muito difícil. Trocar o salário, o emprego, as amizades, a sua casa, sua família e tudo o que a gente já tem pelo desconhecido é de apavorar. E a solidão, sabendo disso, vai fazer questão de sempre nos lembrar e tocar na ferida. Por isso, o jeito é canalizar a solidão em força, pegar a espada jedi e lutar contra o lado negro da força. Aquele tal lado negro que quer nos fazer desistir, que quer nos ver arrependidos, que fará de tudo para nos ver com lágrimas nos olhos e deixando que o desespero tome conta.
Pequenas coisas, grandes desafios
Quando vivíamos a nossa vida, essa que tínhamos até bem pouco tempo, não percebíamos a solidão. Uma simples ida ao hospital, por exemplo, era motivo para reunir os amigos e a família, receber ligações e diversas mensagens. Lembro de ter que fazer um endoscopia e, por conta da anestesia, pedir para o meu vizinho me levar e buscar. Aqui não tem nada disso. Nossa família está a milhares de quilômetros, nosso vizinho não entende o que a gente fala e nós temos que ir de ônibus e , se o dinheiro der, voltar de táxi. Claro, é uma coisinha pequena, um exemplo besta, mas o dia que você sentir isso, você vai me dar razão. Estar longe de todos é normal quando a gente mora fora, mas se sentir desamparado sem ter para quem ligar é complicado.
Evitando pensar na vida
Depois de três anos morando fora, aprendi que no começo da nova jornada a gente deve evitar de pensar na vida. Até porque, quando você toma uma decisão tão importante e parte para o desconhecido, é normal que se as coisas não saírem como o planejado isso traga frustração. E muitas coisas (a maioria) não vão sair como a gente achou que sairiam. Frustra porque tinham dito que era mais fácil, porque não nos contaram toda a verdade do que é morar fora. A gente vai aprendendo na prática, com o passar dos dias, mas isso também nos exige resiliência e a necessidade de encontrarmos uma força que nem sabíamos que éramos capazes de ter. Quando as coisas (mudança, documentos e etc) começarem a se acalmar é que a ficha vai começar a cair e você poderá se dar ao luxo de parar tudo o que está fazendo e se permitir pensar na vida.
Morar fora exige muito de nós, nos faz crescer, nos amadurece, nos mostra que não somos tão importantes como achávamos que éramos, que as pessoas vão seguir suas vidas sem a nossa presença. Porém, morar fora também vai nos trazer uma imensa coragem, vai nos apresentar novos amigos, novas oportunidades e chances que não aconteceriam na vida antiga. A solidão vai aparecer, a saudade vai pegar, mas nós vamos continuar em frente. Vamos em frente porque a vida é assim e porque agora nós nos tornamos mais fortes, mais resistentes, mais corajosos, aprendemos a lidar com o medo e enfrentamos tudo e mais um pouco para realizar os nossos sonhos e achar um espaço no topo da montanha entre os melhores. Não, nós não vamos desistir, até porque se a gente tivesse medo a gente não estaria aqui, já teríamos voltado para casa e nos dado por vencidos.