Seja lá qual for a sua conquista, nem todo mundo precisa/merece saber.
Em tempo de redes sociais e tecnologias bombando, é muito comum, nós que moramos fora, utilizarmos tudo o que facilita a nossa comunicação e pode nos aproximar dos nossos familiares e amigos que estão a milhares de quilômetros. Porém, antes de sair por aí contando alguma de suas conquistas lembre-se: felicidade se sente, não se conta.
Inveja é Foda
Sim, a inveja é foda. E nem me venha com “inveja branca”, “invejinha” ou sei lá o que. Quando nós nos desfizemos de tudo o que tínhamos depois da decisão de morar fora, poucos viram. Quando passamos o dia do nosso aniversário com uma galera que a gente nunca viu na vida e que, sequer, fala a nossa língua, ninguém viu. Os choros, os perrengues que parecem mentira, o fato de ser um estrangeiro e tantas coisas que habitam o nosso coração pouca gente sabe ou sente. Tem um velho ditado que diz: “o povo vê as pingas que eu bebo, mas não sabe dos tombos que eu levo”. Mais certo impossível.
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Vida de Estrangeiro
Para os desavisados que acham que a gente nada no dinheiro fácil, que lida super bem com a saudade, que não dá bola para o sobrinho que nasceu há meses e a gente ainda não conheceu pessoalmente, que a gente não liga nada para a nossa tia que morreu recentemente, que tem o coração de ferro. ACHAM ERRADO, MUUUUITO ERRADO. A gente sente tudo isso, carrega no bolso, na mochila, na foto do celular, na mensagem de áudio, no vídeozinho que chega pelo WhatsApp. A gente sente, a gente chora, a gente se emociona com pouco, as vezes a gente queria um abraço do nosso pai, um carinho da nossa mãe, uma conversa franca com nossos irmãos. Parece pouco, mas só nós sabemos o que não é ter isso ali, disponível.
livro “Morar Fora: sentimentos de quem decidiu partir”
Outro texto de Cláudio – Morar fora: energia sugada
Felicidade se Sente
Aprendi que os momentos de felicidade devem ser sentidos e não contados ou explicados para ninguém. O tão aguardado “sim” do novo trabalho, ganhar o primeiro salário na moeda do nosso novo país, receber um elogio por estar melhorando no idioma, pegar aquele documento que vai fazer muita diferença na nossa vida, fazer novos amigos, se adaptar. Nem sempre são grandes conquistas, muito pelo contrário. Morando fora uma “coisiquinha” de nada se torna O MAIOR EVENTO DE SEMPRE. E nós?! Nós compramos um vinho ou uma cerveja, sentamos numa praça sozinhos ou com o amor da nossa vida do lado ou na tela do celular e sentimos. Sentimos que estamos no caminho certo, que a vida está entrando nos eixos, que o impossível, como diria Chorão, é só questão de opinião.
Saiba para Quem Contar
É lógico que os que nos amam, que aquelas pessoas que torcem por nós de verdade, devem saber das nossas conquistas. Porém, não pense que os “trocentos” amigos da nossa rede social torcem tanto assim por nós. Há, muitas vezes, a tal da inveja. Inveja da nossa coragem, do fato de termos tido peito para enfrentar a mudança, de que não falávamos nada dessa nova língua e hoje somos quase fluentes, de desapegarmos de tudo e de batermos asas. Voar para longe do ninho é para os mais fortes, atravessar fronteiras, ter uma vida a centenas ou milhares de quilômetros da casa onde estava o nosso quarto é para os espirituosos e bem aventurados.
Morar fora é assim, cheio de altos e baixos, de conquistas, derrotas, vitórias, decepções e alegrias. Nossa vida não é moleza, mas vale muito a pena. É aqui que estamos aprendendo a medir o tamanho do mundo, que percebemos que não importa o idioma, a cor do cabelo ou da pele, a roupa ou a religião. Importa quem somos e o que somos, não o que tínhamos ou ainda temos. Aqui do lado de fora, vale muito mais a pena ser do que ter. E nós sabemos disso como ninguém. Se você está conquistando o mundo, talvez seja o seu silêncio ou a sua capacidade de guardar segredos que estejam lhe levando adiante. Se eu pudesse lhe dar uma dica: continue assim, sentindo a felicidade e não contando para ninguém, talvez esta seja a fórmula. Quem sabe?!